domingo, 19 de dezembro de 2010

Campeonato é uma coisa, Copa é outra

Excelente post do Emerson Gonçalves do blog Olhar Crônico Esportivo.



Um campeonato nacional é uma competição aberta. Dela participam todos os clubes de uma divisão – primeira, segunda, terceira – ou série – A, B, C, etc. Depois de consolidado, tem início o processo de ascensão e rebaixamento dos clubes, dentro das divisões ou séries. Para se chegar ao campeão, o ideal é que todos joguem contra todos, em dois turnos. No Brasil, nosso principal campeonato patinou feio durante muitos anos, com fórmulas esdrúxulas, viradas de mesa, inchaço e por aí vai. Bem ou mal, entretanto, sempre foi caracterizado e aceito como a principal competição do país. Esse campeonato, assim descrito e aceito e instaurado oficialmente, teve início no ano de 1971. Antes disso nunca tivemos um campeonato nacional.


Uma disputa denominada taça ou copa tem características diferentes de um campeonato. Seus participantes não são todos os clubes de uma divisão ou série, são clubes que foram previamente qualificados para a disputa, podendo incluir clubes de diferentes divisões ou séries. Ou seja, ela é restrita. Essas competições são disputadas por meio de eliminatórias, muitas vezes simples e diretas, outras vezes com fases de grupos, sempre pequenos – com 4 participantes na quase totalidade dos casos.


Num campeonato nacional, com sua disputa aberta – e é bom enfatizar sempre esse ponto – a todos os clubes de uma divisão e somente uma, o campeão, mesmo que haja fórmulas esdrúxulas, disputa razoável quantidade de jogos para chegar ao título, enfrentando, se não todos os demais participantes, boa parte deles. Hoje, o campeão brasileiro, assim como os demais participantes do torneio, disputa 38 jogos. Em 1989, o Vasco da Gama disputou a metade – 19 jogos. Um número muito baixo, sem dúvida, fruto do modelo que tinha a competição naquele ano, mas ainda assim bastante superior ao número de partidas que disputa o campeão de uma copa ou taça.

Numa competição com esse caráter, o número de partidas disputadas é sempre menor. Na Copa Libertadores, a maior e mais importante copa que nossos clubes disputam, por exemplo, o campeão – atualmente – disputa 14 partidas, sendo 6 na fase de grupos, outras 6 nas 3 fases eliminatórias e mais 2 partidas na fase final.


Na antiga Taça Brasil, por força das circunstâncias da época e da organização e estrutura que tinham nosso futebol, tivemos o Santos conquistando o título duas vezes depois de disputar somente 4 jogos em cada torneio. Vamos e venhamos, não dá para comparar com a campanha de qualquer campeão nacional de fato.

Numa das comparações mais absurdas que já vi, dezenas, talvez centenas de pessoas, tomaram como exemplo de legitimidade como campeão com pequeno número de jogos, o Uruguai, que venceu a Copa do Mundo de 1930 disputando, também, somente 4 jogos. Até aqui, nenhum problema. Uma taça pode ser decidida em um só jogo: venceu, levou, ponto final, história escrita, não se fala mais nisso, apenas celebra-se. A Taça do Brasil, com suas características próprias, permitiu ao Santos ser pentacampeão com um total de 24 jogos. Isso porque, como time de São Paulo, assim como o representante do Rio de Janeiro, já entrava na disputa em uma fase mais adiantada. Novamente, isso nada, absolutamente nada tem a ver com um campeonato nacional e está ótimo e nada há a reclamar quando falamos em uma taça e não de um campeonato nacional.


A Taça Brasil era uma competição nacional, coisa, aliás, que fica clara por seu próprio nome. Mas não era, nunca foi, nunca será, um Campeonato Brasileiro. Sim, ela apontava o representante brasileiro para a Copa Libertadores, tal como a Copa do Brasil também aponta. Esse fato por si só não significa que a competição seja um campeonato nacional. Falando nisso, até a Copa Sul Americana, agora, também manda seu campeão para a Copa Libertadores. Não é a presença na Libertadores que define que um time seja ou não o campeão nacional.


Por motivos diversos, inclusive as distâncias que temos aqui nesse país-continente e a lentidão ou inexistência de meios de transporte capazes de viabilizar uma competição esportiva nacional, somando-se isso à bagunça, à desorganização, à falta de visão e critérios de dirigentes e autoridades diversas, somente em 1971 tivemos nosso primeiro campeonato nacional, nosso primeiro campeonato brasileiro.

As competições que existiram antes foram importantes e legítimas, isso não se discute, disputadas por alguns dos mais fantásticos times da história do futebol, mas não foram campeonatos brasileiros.

Aqui não se trata de mostrar manchetes de jornais da época para provar que o campeão da taça foi chamado de campeão brasileiro. Mormente nos anos sessenta, as manchetes de jornais e revistas tinham a função de atrair a atenção do passante e levá-lo à compra para ler a matéria com tão interessante manchete. O fato de manchetes terem chamado vencedores da Taça Brasil de “campeões brasileiros” não significa, em absoluto, que esses times tenham sido campeões brasileiros dentro da concepção plena do termo, mas ajudaram a venda dos jornais e revistas da época nas bancas.



Não se trata de desmerecer times e jogadores do passado, longe disso. Aliás, é bom que se diga, jogadores que são sempre esquecidos, são lembrados agora, de forma bastante oportunista, e brevemente estarão esquecidos novamente. Ou atacados, como se costuma fazer com o maior de todos, Sua Majestade, frequentemente tratado com deboche, certamente por muitos que agora dizem ser absurdo que ele não tenha o título de “campeão brasileiro”.


Trata-se, tão somente, de estabelecer as coisas como elas são: taça ou copa é uma coisa, campeonato nacional é outra, muito diferente. As duas coexistem, mas uma não pode ser a outra. Se alguém quer que o vencedor de uma taça seja chamado de campeão nacional, paciência, cada um pode pensar do jeito que melhor entender, mesmo que vá contra a lógica dos fatos. Se a confederação, por medida política e rasteira proceder a essa unificação, paciência, novamente. Será apenas mais um ato prepotente e de cunho meramente político de seu presidente, coisa que, por sinal, não é novidade. S.Exa. decidirá sozinho e de forma absoluta, como monarcas pré-Revolução Francesa, sem consultar ao conjunto de clubes, que nunca são consultados para nada ou, quando isso ocorre, as cartas já estão marcadas. Nada de novo, portanto. Assim como nada há de novo na brutal falta de educação de muitas pessoas que se valem da beleza e da facilidade da internet para despejarem mágoas, frustrações, ódios e rancores sobre os demais.


Minha intenção com esse novo post é somente esclarecer alguns pontos que já estavam claros, mas foram deturpados. A função de um blogueiro não é agradar a gregos ou troianos, é apenas expor à discussão seu ponto de vista. Espera-se, sempre, que discussão educada, no mínimo.


Bom final de semana a todos.

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